Dia Nacional da Poesia

Dia Nacional da Poesia

Ao contrário de outras datas comemorativas, o Dia Nacional da Poesia passa em branco na vida dos brasileiros. No Piauí, essa realidade também não é diferente. Não fossem alguns de seus abnegados admiradores, incluindo os que a produzem, ele praticamente nem seria lembrado. Metido em afazeres mais urgentes e importantes, a maioria das pessoas não liga a mínima para esse tipo de manifestação artística, considerada geralmente “inútil” e “incompreensível”. Para completar o absurdo, o próprio comércio livresco silencia totalmente, incapaz de colocar na rua uma mídia criativa e ousada de incentivo à leitura de poesia. Mas, afinal, para que ela serve de fato? Diante de indagação tão frequente, nada melhor que prestarmos atenção nestes versos do poeta Chacal: “Nós que não somos médicos psiquiatras / nem ao menos bons cristãos / nos dedicamos a salvar pessoas / que como nós / sofrem de um mal misterioso: o sufoco”.

Fora algumas ações isoladas, quem não deixou a poesia cair, em Teresina, foi a Sociedade dos Poetas Por Vir, que resolveu celebrar a data com um animado sarau na Casa da Cultura, na última quarta-feira, para onde acorreram muitos dos amantes da poesia. A data de 14 de março é uma homenagem, como todos sabem, ao dia de nascimento do grande Castro Alves, poeta baiano engajado nas lutas políticas e sociais da sua época, bem como cultivador de um lirismo amoroso e sensual. Embora ainda restrito a poucos, ultimamente a poesia vem alargando seu público leitor, sobretudo depois dos saraus literários que pipocam no Brasil inteiro. Em nossa capital, a título de ilustração, destacamos os do Élio Ferreira, Cineas Santos, João Carvalho, Academia Onírica e o dos estudantes citados acima, todos imbuídos do mesmo propósito que “a poesia”, abraçando a tese do nosso talentoso William Soares, “não resolve / mas revolve”.

Pode até ser “inútil” a poesia, como querem alguns, mas que ela proporciona um bem danado na vida da gente, não resta dúvida. Aliás, nunca devemos esquecer que todas as outras manifestações artísticas se originam dela. Daí encontrarmos sua presença num filme inesquecível como “Cinema Paradiso”, do cineasta italiano Giuseppe Tornatore; no maravilhoso quadro “Abaporu”, da pintora paulista Tarsila do Amaral, tela que inspirou os modernistas de 22; no belíssimo registro “Beijo no Hôtel de Ville”, do renomado fotógrafo francês Robert Doisneau; na magnífica obra arquitetônica de Antoni Gaudí, mestre espanhol que resgata criativamente as imagens medievais; na sensacional música “Yesterday”, do genial quarteto de Liverpol. Bom é saber também que para ser poeta, no sentido amplo do termo, não é necessário complicar as coisas, mas apenas seguir o sábio conselho de Patativa do Assaré: “Pra gente aqui ser poeta/ Não precisa professor./ Basta vê no mês de maio/ Um poema em cada gaio/ Um verso em cada fulô”.

Agora façamos a louvação, num ato de reverência e gratidão, dos poetas que tornam a vida suportável e mais interessante, a exemplo de Manuel Bandeira, com seu lirismo terno e comovente. Não esqueçamos também Gregório de Matos, a demolidora sátira de versos contra os desmandos na Bahia. A paixão desenfreada pelo Piauí, em especial por Amarante, do inigualável Da Costa e Silva. A concisão vocabular e a denúncia social de João Cabral de Melo Neto. A ironia fina e o questionamento existencial de Carlos Drummond de Andrade, o mais consagrado dos poetas brasileiros. A postura sempre desafiadora de Torquato Neto, o nosso querido “Anjo torto”. A poesia sugestiva e musical de Cecília Meireles, com textos que tocam fundo a alma da gente. Sem falar dos temas nada “poéticos” de Augusto dos Anjos, o mau gosto transformado em poesia da mais alta qualidade. Enfim, Vinicius de Moraes, com seu amor eterno pelas mulheres, lindas, cheias de graça e, acima de tudo, despertadoras de desejos inconfessáveis. Viva a poesia, hoje e eternamente.